segunda-feira, 21 de abril de 2014

“DEI-VOS O EXEMPLO” 

No evangelho escrito por João, no capítulo 13, versículo 15, encontramos a seguinte frase de Jesus: 

 “Dei-vos o exemplo para que façais a mesma coisa que eu fiz” 

Um certo pregador brasileiro, numa de suas pregações, usou a seguinte afirmação: 

 “A grandeza do Evangelho é que ele não está calcado em falácia, mas em praticidade de vida” 

Essas duas sentenças nos levam (ou pelo menos deveriam nos levar) a refletir sobre a nossa “prática” cristã. Tem sido a nossa prática, verdadeiramente prática? Não estamos nos contentando, e às vezes até nos ‘gabando’ de uma prática excessivamente teórica? 

- ‘Pô’, Anselmo, tu ‘tá’ me confundindo! 

Vou tentar esclarecer, então. Dentro de nossas comunidades cristãs – aliás, isso acontece em todos os segmentos da sociedade, mas vamos nos ater ao âmbito eclesial – existem muitas pessoas que só falam. Pregam, ensinam, admoestam, exortam, convidam... mas só isso. Existem também aquelas que só fazem; correm daqui para ali, fazem um serviço braçal acolá, estão sempre dispostas a sair do seu conforto para “fazer” alguma coisa. E existem aqueles que falam e fazem. 

Mas, primeiro vamos nos concentrar no fazer, até porque é o verbo que Jesus utiliza [duas vezes] no trecho acima. 

Queridos, como estamos equivocados quanto ao verdadeiro sentido do “fazer”.  

Firmamos em nosso entendimento que esse “fazer” consiste primeiramente em algumas ações, tais como: organizar um encontro, um retiro, ornamentar a igreja, o salão, a sala, reformar o teto, o telhado, a cozinha, o presbitério, o coro (que nem se usa mais), preparar e ensaiar músicas, coordenar isso, dirigir aquilo, presidir celebrações, assessorar, ir a certa reunião, estar em certo curso, para depois: falar sobre o que foi dito lá, explanar sobre o que foi aprendido acolá, repetir o que foi ouvido aqui, etc., etc., etc.. E são tantos “afazeres” que o cristão acaba muitas vezes se sentindo cansado e sobrecarregado.

Não quer cansar? Não faz! Não quer se sobrecarregar? Não assume tanta coisa! 

- Tu ‘tá’ querendo dizer que essas coisas não são importantes? 

São importantes, mas não são primordiais. São até necessárias, mas não são imprescindíveis. 

O essencial, o imprescindível, o primordial é ser cristão. E não se é verdadeiramente cristão só fazendo essas coisas. Não é o ornamento da sala de reuniões ou o cronograma bem elaborado do encontro que te faz um bom cristão. Não é o número de encontros e reuniões de que você participa que faz de ti um cristão comprometido com o Evangelho. Não é a quantidade de construções e reformas que você coordena e faz, que garantem que você é uma pessoa de Fé. E, definitivamente, não é o número de atividades que você coordena, que faz de você um verdadeiro discípulo missionário. 

Tudo isso é importante, mas, como ensina Hans Küng, é apenas a forma. A essência é Cristo! E o que Ele quer que façamos, é que sejamos como Ele, em tudo. Até porque, como Ele mesmo disse: Dei-vos o exemplo para que FAÇAIS. 

Mas sobre isso pouco ou nada se faz, embora muito se fale. 

B. F. Skinner, um importante teórico da psicologia comportamentalista, escreveu o seguinte: 

“É bom incentivar as pessoas, ensiná-las. (...) Mas a longo prazo, estamos simplesmente passando a responsabilidade adiante. (...)Nós mesmos temos que fazer o trabalho que queremos que seja feito. Não basta cobrar as outras pessoas para que o realizem”. 

O que temos hoje na Igreja é um bando de pseudointelectuais achando que sabem tudo e que todos os seus ouvintes devem fazer tudo o que eles ensinam, embora eles mesmos estejam mais preocupados com os outros afazeres do que em praticar o que ensinam. Bom lembrar que o próprio Jesus já condena isso em Mt 23, 3.23. 

Falam incansavelmente, com belos, emocionantes e emocionados discursos e sermões, em coisas cristãs como o perdão, a fraternidade, o acolhimento sem preconceito, a caridade (material ou espiritual). Fala-se sobre servir gratuitamente ao irmão; fala-se em paz, harmonia e unidade; fala-se... fala-se... 

E fala-se. 

Mas só fala-se. 

É ínfimo o número dos que realmente praticam essas coisas. 

- Que radical, Anselmo! 

Talvez. Mas o que se presencia, principalmente entre “lideranças”, é um grande número de exemplos de rancor e mágoa, olhares atravessados para quem não comunga da mesma ideia, costas voltadas para aqueles que a vida desfavoreceu, um rol de justificativas para os gestos de egoísmo, tribunaizinhos de sacristia que se encarregam de julgar e condenar uns aos outros, um leva e traz infindável de reclamações, queixas e denúncias sobre este ou aquele irmão, movimentos e pastorais que medem forças como se fossem partidos políticos, y otras cositas más. 

Se fossemos relacionar em duas colunas o que falamos e o que fazemos, veríamos que a coluna do FAZER é tão grande quanto a do FALAR, mas infelizmente uma coluna se opõe à outra. A falácia cristã e a prática estão bem dissonantes. 

Como dizia Skinner: Por que não fazemos nós mesmos aquilo que queremos que seja feito? Por que não somos nós os primeiros a dar o exemplo? Por que não ensinamos, também na prática, o que e como deve ser feito. 

E que tal se colocássemos em nossas cabeceiras Mt 23, e que esse texto fosse o guia do nosso comportamento cristão? 

Pax Domini!